Pensei
muito antes de escrever este artigo, o mais certo era de que não o faria, mas a
morte do jovem Paulo Henrique Feu de Azevedo, 30 anos, na madrugada de
segunda-feira, 1º de junho, mudou muita coisa em mim. Paulo deixa duas filhas
órfãs e uma grande interrogação na forma como estamos enfrentando esta peste
que vem causando estragos em famílias, municípios, estados e nos governos mundo
afora, a Covid 19.
A
notícia da sua morte deu-me arrepios, enjoo, uma sensação mórbida. Fizemos o
mesmo périplo pelas UPAs de Cachoeiro, e no mesmo período. É bem provável que
tenhamos nos cruzado nas recepções ou nas enfermarias da Marbrasa ou do Paulo
Pereira, procurando pela mesma coisa: alívio para nossas dores e respostas a
nossas mazelas.
Ambos
tivemos noites de insônia, de muita preocupação com os filhos, com a família,
com o que vem depois. Ambos tivemos aquele pressentimento de que a morte estava
nos espreitando, nos empurrando devagar ao precipício. Nessa hora, não se
chora, não se sabe o que fazer, somos pó, só isso, um grãozinho de nada
clamando a Deus pela vida. Nesse momento, a espiritualidade nos reprime e
conforta, castiga e perdoa, por fim, responde-nos com perguntas sem respostas.
Tanto
o resultado do Paulo Henrique quanto o meu deram negativo para o Covid19.
Todavia, não nos disseram do que padecíamos. De fato, ele morreu, eu sobrevivi.
Paulo foi enterrado em caixão lacrado, sem velório. Deixou a família em
pedaços, querendo aquelas respostas que não existem. Ele partiu, eu não... Em
algum momento, nossos destinos mudaram de rota.
Meu
problema começou com uma dor na vesícula, velha conhecida. Dessa vez, veio mais
forte, insuportável. Desesperado, como se agulhas perfurassem minhas entranhas,
fui seis vezes à UPA da Marbrasa em busca de sedativos, num espaço de apenas
quatro dias. Não tenho do que reclamar do atendimento, dos médicos, ou mesmo
das enfermeiras. Todos fizeram a sua parte num sistema repleto de erros de
origem.
Quando
as pedras da vesícula deram sinal de que me poupariam, outros sintomas
começaram. Febre, dor de cabeça, coriza, e a sensação de estar sendo atacado
por dentro. Telefonei para o médico, que me receitou antibiótico contra
pneumonia. Dois, três, quatro dias, e nada. Liguei novamente e expliquei o que
se passava.
Ele
me receitou hidroxicloroquina, azitromicina, ivermectina e um composto à base
de zinco para reforçar a imunidade. Obedeci, só não consegui a
hidroxicloroquina, que estava em falta. Havia uma guerra política contra essa
medicação. O médico a substituiu por um remédio de nome Annita, à base de
nitazohanida. Dois dias de suador, daqueles de encharcar o lençol. Adeus febre,
dores e sensações da peste.
Nesse
meio tempo, fui à UPA do Baiminas fazer o exame que chamam de “Suave”, para
detectar a Covid19. Enfiaram um canudinho no meu nariz e rasparam minha
garganta, lá onde faz vômito. Prazo estimado para o resultado: 15 dias. Ciclo
do vírus, 14 dias. Bom, pensei cá com os meus botões em procurar algum médium e
já deixar negociado o repasse do resultado ao além, em caso de infortúnio.
Não
precisou. Dois dias depois a Prefeitura mandou uma equipe a minha casa para
fazer o tal teste rápido, o mesmo que fizeram no Paulo Henrique e que deu
negativo. Em mim também, mas recomendaram manter o confinamento até sair o
resultado do “Suave”. Três dias depois ligaram para me dar a boa notícia: eu
não tinha a peste. Então, era o quê? E o Paulo Henrique?
As
perguntas acima ficarão como aquelas que fizemos na hora do sufoco, de olhos
fechados, buscando o infinito, e respondidas com outras perguntas sem
respostas. No fundo, acho que te conhecia, Paulo. O sorriso que exibe na foto
do site e a sua aparência me parecem bastante familiar. Tenho rogado todos os
dias por sua alma, por suas filhas e sua família. Fica com Deus, amigo.
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